Postado em 16 de Abril de 2019 às 15h25

Hoje Brumadinho...e amanhã?

Gestão Pública (24)

O alarme não soou e quando se percebeu, a lama já arrastava tudo o que estava pela frente.

Por Tuanny de Paula

Sem aviso e um barulho estrondoso. Esse é o relato dos moradores do município de Brumadinho/MG sobre o rompimento da barragem na Mina Córrego do Feijão, administrada pela empresa Vale. O desastre aconteceu no dia 25 de janeiro de 2019, durante o meio dia. Em questão de 90 segundos, mais de 11,7 milhões de metros cúbicos de lama se espalharam pela cidade, arrastando caminhões, casas e pessoas. 

Até o dia 17 de março, segundo informações da Defesa Civil de Minas Gerais, 395 pessoas foram resgatadas e 102 continuam desaparecidos. O número de óbitos marca 206. As buscas prosseguem, para as esperanças dos familiares que ainda esperam por um corpo para enterrar.

Construída em 1976, a barragem de mineração de Brumadinho tinha 86 metros de altura e estava desativada desde 2014. Por fora, tinha a aparência de um grande gramado, mas por dentro, estava cheia de rejeitos minerais. O seu colapso levanta novamente discussões sobre a segurança das barragens construídas pelo País, desde o acidente em Mariana, também no estado de Minas Gerais.

Além de tirar vidas humanas, a natureza também paga o preço pela irresponsabilidade de grandes empresas. Segundo um levantamento realizado pelo Centro Nacional de Monitoramento e Informações Ambientais (Cenima) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), os rejeitos de mineração devastaram 133,27 hectares de vegetação nativa de Mata Atlântica e 70,65 hectares de Áreas de Proteção Permanente (APP) ao longo de cursos d’água afetados.

Uma coloração diferente

A paisagem que até então era verde, tornou-se marrom. A fauna e a flora encontrados estavam no caminho do tsunami de lama foram arrastados por quilômetros. Por fim, o rio Paraopeba, próximo à cidade de Brumadinho, recebeu o que restava da onda de rejeitos.

Toda essa mudança repentina no cenário começou a refletir no funcionamento do meio ambiente. Os animais terrestres que sobreviveram, não tinham onde se alimentar. Os peixes nos rios começaram a emergir, mortos pela contaminação da água. Quem também começou a ter problemas para sobreviver foram os moradores da aldeia Naô Xohã. A comunidade indígena, formada por 27 famílias, uti lizava o rio para higiene e alimentação, através da pesca.

Para o biólogo, pesquisador e professor de Engenharia Ambiental da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Jean Ricardo Simões Vitule, as consequências do despejo desses rejeitos são graves e difíceis de se mensurar para o ecossistema como um todo.

“Grande parte do sistema biológico é diretamente afetado em curta, média e longas escalas temporais. Isso acontece através da bioacumulação e da biomagnificação”.

No caso de Brumadinho, é possível comprovar a olhos nus a catástrofe física ao rio Paraopeba, riachos e ecossistemas adjacentes. Com o tempo, pesquisas podem mostrar a longo prazo os problemas direta e indiretamente ligados ao desastre. “Além disso, existem impactos direto e indiretos para a saúde humana e perturbação de serviços ecossistêmicos, como qualidade de água e pesca. Não se sabe ao certo por quanto tempo a qualidade de pescados será afetada. Para isso serão necessários monitoramentos”, explica Jean. E eles já estão acontecendo. Equipes do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), realizam testes na água do rio Paraopeba e analisam os danos ambientais ao redor do flúmen.

Porém é difícil calcular quanto tempo os minerais irão demorar para se dissipar do ambiente. “Eu realmente duvido que os administradores da lama saibam a quantidade de elementos tóxicos e prejudiciais que existiam ou foram carreados com o rompimento da barragem. E existem também efeitos de carreamento de elementos depositados no fundo do próprio rio que podem ter sido disponibilizados pelo grande volume de água”, aponta o biólogo.

Pesquisadores de Universidades do Estado de Minas Gerais já detectaram mais de 13 elementos químicos na área que a lama se arrastou. Entre eles níquel, magnésio e cádmio. Jean alerta que eles representam riscos incalculáveis para a saúde humana e do meio ambiente.


Minas de lama

Conforme relatório divulgado em 2017 pela Agência Nacional de Águas (ANA), o Brasil conta com mais de 24 mil barragens cadastradas. Apenas 58% estão regularizadas.

As barragens de rejeitos minerais, como a de Brumadinho, contabilizam 769 e são fiscalizadas pela Agência Nacional de Mineração (ANM). Dessas, somente 425 estão inseridas na Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), das quais 219 estão localizadas em Minas Gerais.

 

Definições sobre barragens

Em 1932, na 2ª Reunião Anual da Comissão Internacional de Grandes Barragens, técnicos discutiram a necessidade de estabelecer, com mais precisão, o que significava uma “grande barragem”. Após avaliarem, foi definido que uma grande barragem seria uma estrutura com altura superior a 15m, contando seu ponto mais baixo de fundação até o topo.

Vinte e seis anos depois, na 25ª Reunião Anual e no 6º Congresso da Comissão Internacional, foi acordado que as barragens seriam registradas detalhadamente, a partir das definições adotadas em 1932. As extensas pesquisas são anualmente publicadas em um Registro Mundial de Barragens (World Register of Dams – WRC). O Brasil entrou na organização em 1957, através da Comissão Brasileira de Grandes Barragens. Em 1961, o Comitê Brasileiro de Barragens (CBDB), montou uma Comissão Técnica de Registro de Barragens e passou a organizar um Cadastro Nacional de Barragens (CNB).

No CNB são reunidos dados e características sobre todas as barragens existentes no País. Elas são utilizadas para a elaboração de projetos, para a construção de barragens, para a pesquisa científica e para a avaliação de estatísticas sobre barragens. 

Mariana, o maior desastre ambiental da história do Brasil

Em 2015, a Barragem do Fundão, pertencente à Samarco Mineração S.A., localizada no município de Mariana/MG, se rompeu. Classificada com alto potencial de dano ambiental, os seus rejeitos percorreram um longo caminho de devastação.

A lama destruiu o Distrito de Bento Rodrigues, situado a cerca de 5 km abaixo da barragem. Ela continuou avançando até o Rio Gualaxo do Norte, a 55 km, desaguando no Rio do Carmo. Posteriormente atingiu o Rio Doce, afetando também o litoral do estado do Espírito Santo.

No distrito de Regência, situado no município de Linhares, localizado no estado do Espírito Santo, os danos às áreas de preservação nas margens destes cursos d’água são incalculáveis. Além disso, os prejuízos econômicos e sociais aos moradores e povos indígenas atingidos não foram reparados completamente. 

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